DRUMMING
O compositor norte-americano Steve Reich, nascido em 1936, um dos papas da música minimalista, criou Drumming no início da década de 1970, ao retornar de uma viagem de estudos à África. A peça apresenta um motivo rítmico obsessivo, que vai se desdobrando numa variedade de texturas produzidas pela percussão, madeiras e metais - bongôs, marimbas, glockenspiels e flautas piccolo -, e pela presença sutil de vozes femininas.
Inspirada na estrutura de Drumming, a coreógrafa Anne Teresa De Keersmaeker traduz e enriquece nesta criação de 1998 o espírito da composição: a complexidade da coreografia se constrói sobre uma única combinação de movimentos, ao qual se aplicam numerosas variações no tempo e no espaço. Quando a percussão se cala e os corpos se imobilizam, o espectador percebe a surpreendente jornada proporcionada por esta peça, uma onda de pura dança e puro som, um turbilhão de energia vital.
Reich atingiu nesse trabalho o ápice da técnica aplicada anteriormente em Piano Phase (1967) – na qual os intérpretes quebram o uníssono numa quase imperceptível aceleração que provoca uma progressiva inter-relação entre as frases musicais, em cânone. Keermaker tem na obra de Reich um fio condutor de seu trabalho desde que estreou como coreógrafa em 1982 com Fase, baseada nesta peça.
ANNE TERESA DE KEERSMAEKER
Após estudar dança na Mudra School de Maurice Béjart, em Bruxelas, e no Departamento de Dança da New York University’s School of the Arts, inicia sua carreira com Fase, Quatro Movimentos para a Música de Steve Reich (1982). Em 1983, funda sua companhia ao criar a coreografia Rosas danst Rosas, que alcança rápida projeção internacional.
Por quinze anos, entre 1992 e 2007, De Keersmaeker é coreógrafa residente no teatro La Monnaie, a Opéra Nacional da Bélgica. Durante este período criou uma longa série de trabalhos que vêm sendo apresentados mundo afora.
Em 1995, Rosas e La Monnaie associam-se na criação do projeto educativo P.A.R.T.S. – Performing Arts Research and Training Studios; muitos dos alunos desta licenciatura em dança são hoje bailarinos e coreógrafos de reconhecido mérito, tanto na Europa quanto em outros continentes.
Com um trabalho coreográfico fortemente assentado sobre a relação entre a dança e a música, Anne Teresa De Keersmaeker utiliza desde composições do final da Idade Média a peças do século XX; fez a estreia de criações de George Benjamin, Toshio Hosokawa e Thierry De Mey e colaborou com diversos intérpretes e grupos. Também é vasto o leque de gêneros musicais em que aposta, abrangendo ainda o jazz, a música tradicional indiana e a música pop. Sua grande afinidade com as composições de Steve Reich se traduziu em peças como Fase (1982), Drumming (1998) e Rain (2011). O conjunto de sua obra traz coreografias de forte sensualidade e teatralidade que atestam uma linguagem em permanente evolução, com uma refinada arquitetura. Sua personalidade artística singular tem sido reconhecida com prêmios como o Samuel Scripps American Dance Festival Award (2011).
Outra característica do trabalho de Keersmaeker é o rompimento dos limites da dança pura, em performances que avançam pelo texto como Kassandra, speaking in twelve voices (2004), I said (1999) e In Real Time (2000). Dirigiu também óperas como Duke Blue-beard’s Castle, de Béla Bartók (1998) e Hanjo de Toshio Hosokawa (2004). Vários de seus trabalhos transformaram-se em filmes de dança, assinados pela própria coreógrafa, por Thierry De Mey e por Peter Greenaway, entre outros.
Nos últimos anos, Anne Teresa vem repensando os parâmetros do seu trabalho como coreógrafa. A colaboração estreita com artistas como Alain Franco (em Zeitung, 2008), Ann Veronica Janssens (Keeping Still Part, 2008; The Song, 2009; Cesena, 2011), Michel François (The Song, En Atendant, 2010) e Jérôme Bel (3Abschied, 2010) abre caminhos para questionar e reconsiderar os elementos essenciais da dança - o tempo e o espaço, o corpo e a voz, os movimentos e a relação com o mundo.
Seus mais recentes trabalhos são Partita 2 (2013), um dueto com o bailarino e coreógrafo Boris Charmatz, construído sobre a peça de Bach, Vortex Temporum (2013), sobre peça de Gérard Grisey e Verklärte Nacht (2014), um pas-de-deux com música de Arnold Schönberg. No conjunto de livros e DVDs Choregrapher’s Score, publicado pela própria companhia Rosas e pela editora inglesa Mercatorfonds (maio de 2012 / julho 2013 / Outubro de 2014), Anne Teresa discorre sobre a criação de seus quatro primeiros trabalhos: Drumming, Rain, En Atendant e Cesena, em diálogos com Bojana Cvejic, conceituado musicólogo e teórico em performances.
CIA. DE DANÇA ROSAS
O grupo Rosas, da bailarina e coreógrafa Anne Teresa De Keersmaeker, ganhou a atenção da cena internacional com a criação de Rosas danst Rosas, para música de Thierry De Mey e Peter Vermeersch, em 1983. Nos últimos anos, Anne Teresa tem criado para a companhia uma série de trabalhos em que a dança acontece como escrita pura no tempo e no espaço. No centro conceitual de seu trabalho está a relação entre movimento e música e, em algumas produções, a relação entre dança e texto.
Rosas se estrutura para propiciar um trabalho contínuo e intenso com cada artista, um modelo organizacional que Anne Teresa De Keersmaeker escolheu. Nas produções de grande porte, o grupo todo sobe ao palco; em produções de menor escala, De Keersmaeker faz, muitas vezes, uma participação como dançarina. A companhia tem como premissa apresentar seu repertório enquanto trabalha em novas criações, mantendo viva sua história e a transmitindo às novas gerações de bailarinos e ao público.
Com fortes conexões internacionais, a companhia se apresenta em importantes espaços da dança contemporânea, dentro e fora da Europa, mantendo como prioridade, no entanto, sua permanência na Bélgica - onde conta com uma longa parceria com os maiores centros nacionais de artes cênicas.
A companhia dedica considerável atenção e energia aos projetos educacionais e participativos e à arte-educação, mantendo um compromisso ainda com um circuito de espaços menores.
Rosas é um espaço aberto e compartilha sua infraestrutura não somente com a P.A.R.T.S. (escola fundada pela companhia Rosas e De Munt / La Monnaie, financiada pelo Ministério da Educação da Comunidade Flamenga), como também com o grupo musical contemporâneo Ictos e com o Workspace Brussels, uma organização que oferece suporte para jovens artistas. A experiência em gestão, comunicação e a expertise administrativa de Anna Teresa De Keersmaeker são compartilhadas e difundidas. Essa troca contribui para que o espaço da Companhia em Bruxelas se torne cada vez mais uma referência e um ponto de encontro não somente da dança, mas dos mais diversos talentos artísticos.
Coreografia: Anne Teresa De Keersmaeker
Dançado por Polina Akhmetzyanova, Boštjan Antončič, Cynthia Loemij, Marta Coronado, Carlos Garbin, Fumiyo Ikeda, Anneleen Keppens, Sandra Ortega Bejarano, Elizaveta Penkova, Igor Shyshko, Marco Torrice, Samantha van Wissen, Sue-Yeon Youn
Criado em 1998 com o elenco original formado por Iris Bouche, Bruce Campbell, Marta Coronado, Alix Eynaudi, Fumiyo Ikeda, Martin Kilvády, Oliver Koch, Cynthia Loemij, Roberto Oliván de la Iglesia, Ursula Robb, Taka Shamoto, Rosalba Torres
Música: Drumming - Steve Reich
Cenário e iluminação: Jan Versweyveld
Assistente de cenografia e iluminação: Geert Peymen
Figurinos: Dries Van Noten
Assistente de figurino: Anne-Catherine Kunz, Aouatif Boulaich
Assistente de coreografia para a remontagem: Roberto Oliván de la Iglesia
Direção de ensaios: Cynthia Loemij
Assistente de direção artística: Anne Van Aerschot
Diretor técnico: Joris Erven
Técnicos: Wannes De Rydt, Bert Veris
Guarda-roupa: Valerie Dewaele
Produção 1998: Rosas, De Munt / La Monnaie (Brussel/Bruxelles/Brussels), La Bâtie – Festival de Genève
Coprodução 2012: De Munt / La Monnaie (Brussel/Bruxelles/Brussels), Sadler’s Wells (Londen/Londres/London), Les Théâtres de la Ville de Luxembourg
Estreia: 07.08.1998, ImPulsTanz - Festival Internacional de Dança de Viena