O compositor Francis Hime Foto: Divulgação/Nana Moraes
Bolívar Torres
O Globo - 11/11/2019 - 04:30 / Atualizado em 11/11/2019 - 09:38
RIO — Oitenta anos completados em agosto, Francis Hime não quer olhar para trás. É o momento presente que alimenta o seu mais novo álbum, “Hoje”, que será lançado nesta quarta-feira, às 20h, na Grande Sala da Cidade das Artes. Com participação de Zé Renato , Olivia Hime , Leila Pinheiro e a Jazz Sinfônica Brasil , o show abre o 57º Festival Villa-Lobos , do qual o compositor e pianista é um dos homenageados. Embora promova alguns reencontros (leia crítica abaixo), o disco mostra um Hime em busca de novos caminhos.
— O negócio é estar vivo, com muito carinho e muito amor — diz ele. — Depois dos 80, tem que acelerar, aproveitar o tempo, que passa tão depressa. Gosto de trabalhar como se não tivesse feito nada antes disso. Porque quando você olha para o passado, fica nostálgico, e isso pode te aprisionar.
A pressa também fez parte da produção de “Hoje”, concebido a toque de caixa para poder ser lançado no festival. À princípio, Hime não planejava gravar disco para marcar os seus 80 anos. Mas eis que, na metade de 2019, o compositor acordou certa noite de sonhos inspirados, com uma melodia na cabeça. Ainda semidesperto, registrou a epifania no celular, virou para o lado, dormiu de novo. Dias depois, recebeu do além-mar alguns versos do poeta e amigo português Tiago Torres da Silva. Mágica do acaso, o poema casava perfeitamente com a melodia. Abracadabra: fez-se “O tempo e a vida”, a primeira das 12 composições do novo álbum.
No show de quarta, ele apresenta seis músicas do novo trabalho. No palco, terá a companhia da Jazz Sinfônica Brasil, de São Paulo, que completa 30 anos e participa pela primeira vez do Festival Villa-Lobos. O programa ainda reserva lugar para clássicos do compositor (como “Atrás da porta” e “Trocando em miúdos”) e alguns movimentos da sua “Sinfonia do Rio de Janeiro de São Sebastião”.
No concerto inaugural, a Jazz Sinfônica também vai executar obras do compositor e regente Claudio Santoro (1919- 1989), outro homenageado do festival, que vai até domingo (veja os destaques da programação ao lado). Santoro viveu na Alemanha entre 1970 e 1978 e lá conquistou renome internacional, além de lecionar na Escola Superior de Música de Heidelberg-Mannheim. De volta ao Brasil, fundou a Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional de Brasília.
— Santoro é considerado um dos maiores sinfonistas do país, além do artista brasileiro mais importante no exterior depois de Villa-Lobos — diz Marcelo Rodolfo, diretor artístico do festival.
Crítica
O rei do ‘feat’, avant la lettre
Por Bernardo Araujo
O feat está na moda, o mundo aplaudiu. É um barato, é um sucesso, dentro e fora do Brasil, mas Francis Hime há décadas já gravava discos com canjas de mil parceiros, amigos, companheiros e da patroa Olivia Hime. Francis não recebe Maluma nem tem produção de Papatinho em faixas deste “Hoje”, mas sabe bem que não é um cantor, mas um compositor, harmonizador e melodista raro, capaz de pensar em pérolas como “Desdenhosa” (pelo nome já se entende que é um choro), deliciosa abertura do disco, com letra igualmente saborosa de Hermínio Bello de Carvalho.
O time de parceiros, como se pode esperar do disco em que Francis comemora 80 anos, é da pesada: Chico Buarque canta a bela “Laura”, sinuosa colaboração dos dois caros amigos (a dupla que deu ao mundo “Pivete”, “Passaredo”, “Trocando em miúdos”...); Lenine empresta dramaticidade a “O tempo e a vida” (Francis e Tiago Torres da Silva); Adriana Calcanhotto faz dueto com o dono da bola em “Floresta pra ficar”, dos dois; e Olivia usa sua técnica em “Pietá” (Francis e Silvana Gontijo).
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